Epoca Negocios

Cristina Junqueira, do NUBANK

PARA CRISTINA JUNQUEIRA, COFUNDADORA E PRESIDENTE DO NUBANK NO BRASIL, AMEALHAR MAIS DE 40 MIL CLIENTES POR DIA É CONSEQUÊNCIA DE UM MODELO DE NEGÓCIOS CRIADO PARA RESOLVER OS PROBLEMAS DELES

POR CRISTIANE MANO

AOS 37 ANOS, CRISTINA JUNQUEIRA é a única mulher entre os fundadores de unicórnios no Brasil. Formada em engenharia de produção pela Universidade de São Paulo e com MBA pela conceituada escola de negócios Kellogg, nos Estados Unidos, ela conta que conheceu o colombiano David Vélez, de quem se tornou sócia, quase por acaso. Ao lado dele e do americano Edward Wible, assumiu um papel fundamental como a única sócia com experiência no mercado financeiro brasileiro naquele momento.

Com a promessa de menos burocracia e menos tarifas, o Nubank se tornou em 2021 o primeiro unicórnio brasileiro a ultrapassar um valor de mercado de dois dígitos. Com mais de 40 milhões de clientes, neste ano a empresa recebeu em dois aportes a rodada recorde de US$ 1,15 bilhão – mais da metade dos US$ 2 bilhões que havia captado desde sua criação. O nascimento de sua terceira filha – Cristina já é mãe de Alice, de 7 anos recém-completados, e Bella, de 1 ano e 10 meses – é esperado para fevereiro, quando a companhia já terá feito sua estreia na Bolsa de Nova York, com uma avaliação estimada em mais de US$ 50 bilhões. É um patamar acima do valor atual do septuagenário Itaú, de onde Cristina, aos 29 anos, pediu demissão para buscar um novo caminho profissional. Seguem trechos da entrevista concedida por ela a Época NEGÓCIOS, antes do anúncio do IPO, no final de outubro.

ÉPOCA NEGÓCIOS Por que você trocou a vida numa grande empresa para se tornar empreendedora?

CRISTINA JUNQUEIRA Pessoas como eu, em um ambiente de comando e controle, incomodam loucamente. Mesmo dando resultados, eu incomodava muito. Meus times sempre gostavam de mim, porque eu era muito inclusiva, colaborativa, sempre dividi muito conhecimento. Mas a quantidade de problema que criei porque queria fazer as coisas de um jeito diferente era imensa. Decidi encontrar um lugar que valorizasse essas características. E acabei construindo um. Mas quando eu saí do banco, eu não saí para empreender. Nessa época, me dei uns três ou quatro meses para pensar. Li uma quantidade enorme de livros. Acordava antes das 7 da manhã e ia para a frente do computador. Dormia às 11, às vezes meia-noite, depois de ficar o dia inteiro lendo, pensando, escrevendo. No final, fiquei só dois meses parada, até encontrar o David.

NEGÓCIOS E como foi esse encontro? CRIS JUNQUEIRA Um headhunter que o conhecia de outros carnavais, e também era próximo de um amigo meu, me apresentou a ele. Estava nesse momento de transição e era parte do trabalho dele conhecer pessoas. Depois ele me ligou e disse que achava que seria bom eu conhecer o David. Marquei um café, e fui totalmente despretensiosa, só pra conhecer mesmo. A gente ficou umas duas horas e meia conversando. Naquela noite eu não dormi. A primeira conversa foi numa quinta. No fim de semana falamos de novo e discutimos muito o caso da Capital One [banco americano que cresceu com a promessa de descomplicar e cobrar menos tarifas]. Na segunda, falei: “Cara, é isso aí, vamos embora!”.

NEGÓCIOS Douglas Leone, diretor do gigante fundo de venture capital Sequoia, e um dos primeiros investidores do Nubank, disse recentemente a Época NEGÓCIOS que um dos conselhos que deu ao David foi: “Não monte um banco, monte uma empresa de tecnologia”. Na prática, o que isso significa?

CRISJUNQUEIRANA apresentação de cultura que o David mostra para os funcionários novos, tem exatamente essa frase. E faz toda a diferença do mundo, sobre a maneira como a gente pensa no cliente, e não parte de um objetivo de lucro e rentabilidade para depois se virar e empurrar isso para o cliente. Essa frase diz muito sobre como resolvemos problemas. Sempre usando tecnologia, com eficiência e escalabilidade. Empresas de tecnologia são muito mais abertas à inovação, então não tem aquela galera que fica apegado ao passado. Muito pelo contrário, são empresas que querem que o futuro chegue logo.

NEGÓCIOS Como seu papel evoluiu à frente do Nubank, do momento zero até hoje, uma empresa que atende mais de 40 milhões de clientes?

CRIS JUNQUEIRA Quem trabalha comigo já me ouviu falar duas coisas. Se alguém perguntar o que você faz aqui, é pra falar: “Eu faço o que precisa”. Se alguém perguntar “Você responde para quem?”, é pra falar: “Respondo pra quem pergunta”. Essas são as regras. Vale para o meu time e vale pra mim. Com o tempo, fomos passando as responsabilidades para um, para outro. Algumas viraram bumerangues, foram e voltaram, e tudo bem. Enquanto tiver pessoas melhores que eu pra fazer, é maravilhoso que elas façam. E o que for preciso que eu faça, eu vou fazer.

A PRIMEIRA CONVERSA [COM O DAVID] FOI NUMA QUINTA. NA SEGUNDA, FALEI:

“É ISSO AÍ. VAMOS EMBORA!”

NEGÓCIOS Antes do Nubank, quais experiências prepararam você para esse tipo de atitude?

CRIS JUNQUEIRA Sou a mais velha de quatro irmãs e cresci num ambiente que demandou muita maturidade desde cedo. Meus pais sempre trabalharam muito. Muitas vezes acordava e eles já tinham saído e, quando ia dormir, eles ainda não tinham chegado. Com uns 11 anos, eu já fazia compra de mês para a minha mãe. Com uns 14, lembro de levar minhas irmãs ao médico.

NEGÓCIOS Vocês fizeram diversas contratações de executivos globais nos últimos tempos. Por quê? CRISJUNQUEIRAUM dos primeiros foi o Lucas Pettinati, nosso vice-presidente de design, que foi [diretor na matriz em em empresas como] Google, Yahoo e Facebook [contratado em 2019]. Em junho, contratamos o Arturo [Nuñez, vice-presidente de marketing e ex-executivo do Facebook], para uma vaga que eu fiquei mais de um ano para contratar. Estamos indo atrás das melhores pessoas em todo o mundo.

NEGÓCIOS Nos últimos meses, a companhia passou a oferecer novos produtos como empréstimos e investimentos. Um portfólio mais amplo deve aumentar a margem da empresa, que registrou lucro líquido pela primeira vez no primeiro semestre de 2021? CRIS JUNQUEIRA Na prática, a gente já gera caixa há quatro anos, desde 2017. O próprio cartão de crédito, nosso primeiro produto, já gera lucro há muito tempo. Acho que de todas as coisas erradas que falam sobre o Nubank, a mais errada é: “Eles vão ter de dar dinheiro em algum momento”, como se fôssemos uma empresa sem um modelo de negócios certo. Mesmo o cartão roxinho sem anuidade, sem tarifa, dá dinheiro. A nossa base de custo é muito menor em relação à de um banco tradicional.

NEGÓCIOS Como você se imagina daqui a dez anos?

CRISJUNQUEIRAESPERO que eu esteja aprendendo muito, como estou hoje, fazendo coisas novas. Ter impacto é o que mais me motiva – foi em busca disso que eu parti há quase dez anos.

“PESSOAS COMO EU, EM UM AMBIENTE DE COMANDO E CONTROLE, INCOMODAM

LOUCAMENTE”

SUMÁRIO

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2021-11-30T08:00:00.0000000Z

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