Epoca Negocios

Fabricio Bloisi, do IFOOD

A EMPRESA JÁ ATINGIU A MÉDIA DE 60 MILHÕES DE ENTREGAS POR MÊS E ACREDITA QUE AINDA PODE CRESCER MUITO MAIS

JULIANA CAUSIN

VOCÊ JÁ DEVE ter notado que os motociclistas – e ciclistas também – que entregam comida nos horários de almoço e jantar nas cidades brasileiras são cada vez mais numerosos. Principalmente aqueles que levam na garupa um baú vermelho com o símbolo do ifood, a empresa que lidera o serviço de entrega de refeições no país. Nas capitais, é raro encontrar alguém que nunca tenha encomendado ao ifood um sanduíche, uma pizza ou mesmo uma fina refeição de restaurante estrelado. “Estamos conectados a 300 mil restaurantes e damos trabalho para dezenas de milhares de entregadores”, orgulha-se o CEO da empresa, Fabricio Bloisi.

O exército de entregadores do ifood já se aproxima dos 200 mil, segundo o CEO, que cita o alto nível de satisfação de seus colaboradores, revelado por uma pesquisa, para se defender de críticas às condições de trabalho proporcionadas pela empresa. Na entrevista a seguir, Fabricio Bloisi prega a necessidade de uma atualização das leis trabalhistas para viabilizar mais benefícios e fala da contribuição dos unicórnios para o país avançar em questões como a educação, a sustentabilidade e a inclusão social.

ÉPOCA NEGÓCIOS O ifood completou dez anos em 2021. Como você vê a evolução no ambiente de tecnologia e inovação no Brasil nesse período? FABRICIO BLOISI As maiores empresas dos estados eram bancos e petroleiras até 20 anos atrás, quando foram ultrapassadas por empresas de tecnologia como Microsoft, Google, Apple e Facebook. A mesma coisa aconteceu na China. No Brasil, essa mudança ocorreu de um ano e meio para cá, com fintechs como Nubank, XP e Stone crescendo muito, assim como empresas de varejo como Magalu e Mercado Livre. Isso é muito bom para o país, porque essas empresas são todas inovadoras e compreendem a importância de investir em inclusão e sustentabilidade. O ifood, que é um líder global no segmento de food delivery, também está nessa lista. Eu acredito que os países que vão dar certo nos próximos dez ou 20 anos são aqueles que estão investindo em inteligência artificial, biotecnologia, robótica, fontes sustentáveis de energia.

NEGÓCIOS O que esperar das novas tecnologias nos próximos anos? BLOISI Vão continuar mudando o mundo, em ritmo cada vez mais rápido. Tem gente que reclama que as mudanças já são muito rápidas. Não é errado pensar assim, mas é ingênuo. As empresas e os países que conseguirem surfar nas transformações criarão e distribuirão riquezas. Felizmente, criar uma empresa de tecnologia no Brasil deixou de ser exceção, nos últimos anos. Já temos várias companhias inovadoras que valem mais de US$ 1 bilhão, e a tendência é que elas passem a valer US$ 10 bilhões ou US$ 100 bilhões nos próximos anos.

NEGÓCIOS Como o ifood pretende continuar inovando a partir desses novos recursos?

BLOISI Eu acho que estamos só começando. As pessoas que há cinco anos tinham receio de fazer compras pelo celular hoje fazem três pedidos por mês, em média, de comida pronta. Em 20 anos, cozinhar em casa vai ser um hobby, uma diversão com a família, porque o normal será encomendar refeições prontas. Se hoje eu já uso inteligência artificial para ajudar as pessoas a escolher o que querem comer, com base nas preferências delas, imagine como será no futuro. A tecnologia já me dá acesso aos dados do consumidor e me permite distribuir os entregadores conforme o histórico de demanda de cada região. Com isso, o consumidor recebe a comida mais rápido e a empresa faz mais entregas.

NEGÓCIOS Quantas entregas vocês fazem por mês?

BLOISI Cerca de 60 milhões. O mercado todo, que fazia só 5 milhões alguns anos atrás, tem potencial para fazer 500 milhões de entregas por mês, não tenho dúvida disso. E vai

É INGÊNUO PENSAR QUE AS MUDANÇAS ESTÃO ACONTECENDO MUITO RÁPIDO, PORQUE VÃO ACELERAR MUITO MAIS

abastecer o consumidor com preço e qualidade cada vez melhores. Usar a tecnologia em negócios que eram pequenos não faz só o ifood crescer. Faz 300 mil restaurantes crescerem e abre vagas de trabalho para milhões de pessoas. Às vezes as pessoas acham que a tecnologia é ruim, porque rouba empregos, mas ela cria empregos melhores, torna os produtos mais acessíveis e aumenta o consumo das pessoas.

NEGÓCIOS A inovação tecnológica dialoga com as práticas da empresa? BLOISI Eu acredito que as empresas de sucesso no futuro serão as mais rápidas, mais inovadoras e mais conectadas com a sociedade. Não acho que o capitalismo é ruim, o capitalismo é o que fez a gente progredir um monte. Mas eu não posso focar apenas em resultado financeiro. Devemos focar no desenvolvimento, por isso incorporamos a educação, o meio ambiente e a inclusão como valores da empresa. Criamos os projetos ifood Educa, ifood Regenera e ifood Inclui, que reforçam esses princípios, e apoiamos mais de 50 ONGS. Estamos incentivando entregas de bicicletas e de motos elétricas, promovendo cursos de inteligência artificial e empreendedorismo, procurando contratar mais gente da periferia. Doamos 2 mil toneladas de alimentos no último ano.

NEGÓCIOS Você acredita que o ifood oferece trabalho seguro e justo aos entregadores?

BLOISI Acredito muito. Uma pesquisa de satisfação que encomendamos ao Ibope mostrou que sete entre dez entregadores dá nota 8, 9 ou 10 para o ambiente de trabalho no ifood. A maioria disse que nunca ganhou tanto e que está satisfeita com a flexibilidade que esse trabalho permite. Óbvio que o entregador ganha menos do que um profissional mais qualificado, mas estamos gerando emprego para dezenas de milhares de pessoas com um cuidado enorme. Durante a pandemia, melhoramos as condições de trabalho deles com seguros de entrega, seguros em caso de acidente, seguros em caso de covid-19. Para dar mais benefícios sociais aos entregadores precisamos mudar a legislação trabalhista, que está ultrapassada. Porque há milhões de pessoas fazendo um trabalho que não existia há cinco anos, e nossa lei é de 70 anos atrás.

NEGÓCIOS Como o ifood se posiciona em relação a temas que estão em debate na sociedade?

BLOISI Temas como educação, meio ambiente e inclusão, que inclui diversidade, são muito importantes para nós, já falei sobre isso. Não dá mais para a gente ignorar problemas de discriminação de qualquer tipo, de racismo, por exemplo. Acho que todas as empresas, não só as de tecnologia, devem participar desse debate. Eu quero reforçar que sempre somos a favor do diálogo. Existe hoje no mundo da internet uma polarização que está dificultando o diálogo. Isso está acontecendo no Brasil, nos Estados Unidos e em vários outros países. Recentemente divulgamos uma nota em que nos colocamos absolutamente contra o racismo, reafirmando que essa é uma questão inegociável para a empresa. E fizemos uma segunda nota dizendo que somos a favor do diálogo. Deixamos isso bem claro, porque um dos apresentadores de um podcast que era patrocinado pelo ifood [Flow] fez uma declaração que consideramos racista. Depois o apresentador lançou uma nota dizendo que também era contra o racismo. E o que nós fizemos? Dissemos: “Que

A A EMPRESA FAVOR DE É MAIS BENEFÍCIOS SOCIAIS PARA OS ENTREGADORES. MAS SÓ SE A

LEI MUDAR

bom, então somos todos contra o racismo, e tem de ser assim mesmo”. Na minha opinião, não só o ifood, mas qualquer grande empresa tem de buscar valores e se posicionar com clareza. A gente é a favor de metas para o meio ambiente não para 2050, mas agora, para 2022. Somos a favor da inclusão. E acreditamos ter uma mentalidade muito aberta e flexível para dizer: “Vamos puxar isso para hoje, vamos correr atrás e vamos dar o exemplo”. Sei que nesse mundo de radicais, tudo que eu falar aqui, na posição de presidente de uma empresa grande de tecnologia, pode gerar um pouco de confusão. Mas quero deixar bem claro que sempre vamos defender o meio ambiente, a educação, a inclusão e a redução de dívidas históricas. Às vezes isso gera um pouco de barulho, mas eu diria que gerar um pouco de barulho faz parte do mundo de hoje. Mas sem abrir mão do diálogo.

NEGÓCIOS A defesa desses valores deve ser uma marca das empresas de tecnologia e inovação para a próxima década? São parte também do que vocês querem construir nos próximos anos para o ifood? BLOISI Sim. Acho que isso se conecta com tudo o que falei antes. Hoje há várias empresas no Brasil afinadas com esses valores como nunca estiveram antes. Isso é muito bom para inspirar o rejuvenescimento de outras grandes empresas. Na Cop26 eu comentei com um amigo sobre o grande número de empresas presentes na conferência que estavam empunhando a bandeira do meio ambiente. Foi uma coisa que nos impressionou mesmo. Vou contar também outro fato positivo que observei no esforço das empresas em superar a pandemia. As empresas de tecnologia e as grandes empresas, em geral, que até cinco anos atrás estavam focadas apenas em entregar lucro, perceberam que tinham de se aproximar umas das outras para construir um Brasil que precisa de ajuda. O ifood fez muita coisa na pandemia, com uma lista de mais de 50 ações, milhões de reais e um monte de parcerias. Até porque a gente nunca falou que o nosso negócio era só entregar comida. Não. Também queremos contribuir para construir uma sociedade melhor. Acho que os unicórnios brasileiros ajudam outras empresas a encontrar seus valores. Claro que tem o papel do governo, mas as empresas podem ajudar nos problemas do país. Ter mais unicórnios eu acho que é ter mais empresas engajadas nisso, e isso é muito bom para todos.

NEGÓCIOS Esses valores e essa preocupação com a construção de uma sociedade melhor são transversais entre os unicórnios? Você acredita que as outras empresas estão olhando para isso também?

BLOISI Sim, acho que os fundadores de unicórnio estão com a cabeça mais conectada com o futuro. Com esses valores novos. E isso é muito bom para o Brasil.

NEGÓCIOS Como você enxerga o futuro dos unicórnios?

BLOISI Eu quero ressaltar o otimismo. É muito bom ver cada vez mais empresas de tecnologia crescendo. Isso significa geração de oportunidades, que o Brasil está se preparando para ser mais competitivo no futuro. E isso é bom para a sociedade como um todo. Eu estou otimista, animado e quero reforçar: estamos só começando. Tem muito mais empresas crescendo e coisas legais acontecendo. Espero que mais pessoas abracem essas oportunidades.

NA PANDEMIA, O IFOOD MANTEVE O SERVIÇO DE ENTREGAS COM UMA LEGIÃO DE QUASE 200 MIL COLABORADORES

SUMÁRIO

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2021-11-30T08:00:00.0000000Z

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