Epoca Negocios

Wagner Ruiz, do EBANX

TORNAR-SE UNICÓRNIO, PARA O CONFUNDADOR DA EBANX, WAGNER RUIZ, AUMENTA A ADRENALINA – MAS O EFEITO PASSA RÁPIDO. O DIA SEGUINTE JÁ É DE PENSAR NA PRÓXIMA CONQUISTA

HUMBERTO MAIA JUNIOR

OCOMEÇO DA HISTÓRIA do Ebanx, empresa que atua com pagamentos na América Latina, foi marcada por um episódio que, hoje, é interpretado como “aprendizado fundamental” na história da fintech fundada em Curitiba por Alphonse Voigt, João Del Valle e Wagner Ruiz. Mas poderia ter significado seu fim antes que pudesse começar. Em 2012, o Ebanx dava seus primeiros passos e foi aceito no processo de seleção dos Empreendedores Endeavor que ocorreria em Miami. A apresentação não ia bem. Alphonse, João e Wagner não tinham informações sobre o negócio nem conseguiam explicar o projeto. Até que um dos mentores da banca disse:

— No mundo, existem dois tipos de pessoas: os líderes e os seguidores. Para mim, vocês parecem apenas seguidores.

Parecia o fim. Mas havia um jantar à noite – a última oportunidade de aprovação. Depois de muitas conversas, eles conseguiram mostrar a viabilidade do negócio. O Ebanx foi aceito. Ali se iniciava a trajetória para se tornar uma empresa de pagamentos presente em 15 países da América Latina, que já intermediou o pagamento de cerca de 70 milhões de

consumidores em sites como Airbnb, Aliexpress, Spotify e Uber e se tornou unicórnio em 2019. “Dá adrenalina, mas passa logo”, afirma Ruiz.

O trio se conheceu de maneira peculiar. O advogado Voigt conhecera Ruiz num curso de filosofia e desenvolvimento mental. Wagner era o professor, trabalhava no mercado financeiro e já tinha fundado outras oito empresas. Alphonse, atualmente presidente do conselho de administração, apresentou a ideia do Ebanx. Wagner aceitou e começou a pensar em viabilizar o negócio. Os dois bateram à porta de dez bancos. Um aceitou e, juntos, criaram o modelo de negócios para processamento de pagamentos. Depois disso, faltava alguém para cuidar da parte de tecnologia. Era Del Valle, apresentado por um amigo, sócio de uma empresa de tecnologia em Curitiba.

A rodada de investimentos mais recente aconteceu em junho de 2021, na qual a companhia levantou US$ 430 milhões, liderada pela Advent International. O cofundador Wagner Ruiz, atualmente chief risk officer da empresa, falou a Época NEGÓCIOS. ÉPOCA NEGÓCIOS Como foi a criação do Ebanx?

WAGNER RUIZ O Ebanx começou em 2012, quando criamos uma empresa de pagamento. Nossa ideia era resolver um problema simples: sites internacionais queriam vender para brasileiros, mas uma parte considerável das transações com cartões de crédito não era aprovada. E os sites estrangeiros não aceitavam boleto. Um amigo nosso, de fora do país, contou que os brasileiros pediam pagamento via boleto e ele nem sabia o que era isso! Tudo começou com o boleto. No fundo, estávamos resolvendo a dificuldade de sites internacionais em vender para brasileiros. Pouco depois vimos que poderíamos atuar facilitando o pagamento com cartão de crédito.

NEGÓCIOS Qual era o índice de aprovação dos pagamentos na época? RUIZ Em torno de 25% para sites internacionais. Já para sites nacionais, pouco acima de 80%. Hoje, nossos níveis de aprovação estão em torno de 95%.

NEGÓCIOS O Ebanx é um dos unicórnios brasileiros mais internacionalizados e adotou como alvo países da América Latina. Como ocorreu esse processo? RUIZ Primeiro havia a questão de proximidade. Mas a oportunidade de internacionalização surgiu porque um estabelecimento que já era nosso cliente nos procurou dizendo que tinha um problema no México e perguntou se a gente não poderia ajudá-lo. E aí fomos para o México. Depois, resolvemos olhar para outros países – Chile e Colômbia. A ideia de “fechar” a América Latina tem uma razão comercial simples. Empresas globais tendem a

TUDO COMEÇOU COM O BOLETO. ESTÁVAMOS RESOLVENDO A DIFICULDADE DE SITES INTERNACIONAIS EM VENDER PARA BRASILEIROS

tomar decisões por regiões. O processo decisório é sempre regional. E os clientes têm sistemas integrados. Por isso, faz sentido uma empresa ter o mesmo serviço para toda a região e não apenas em um determinado país. Se estivéssemos apenas no Brasil não teríamos condições de ter grandes clientes. Por isso, não adianta ter presença na América Latina e na Turquia, por exemplo, porque a Turquia faz parte de outra regional. Além disso, há a questão cultural e a proximidade. Somos focados no conhecimento local.

NEGÓCIOS O mercado latino-mericano é difícil?

RUIZ Costumo brincar dizendo que as pessoas de fora da América Latina acham que somos todos iguais. Não é verdade, mesmo que o idioma, o espanhol, seja o mesmo em quase todos os países. O México é diferente da Colômbia, que é diferente da Argentina, que é diferente do Uruguai.

Cada país tem sua característica e seus desafios. E te digo que a primeira vez que me senti um gringo de verdade foi quando iniciamos nossa operação no México. Tivemos de aprender – e respeitar – a cultura e regulação local. Mas hoje aprendemos o processo e conseguimos entrar num novo país em três meses.

NEGÓCIOS Quais foram os maiores desafios dos primeiros anos?

RUIZ Tivemos algumas grandes pedras ao longo do nosso caminho desde o começo. Entramos num mercado consolidado como o de pagamentos e oferecendo um modelo novo. Não foi fácil quebrar paradigmas. Outro desafio foi do ponto de vista regulatório, mas houve uma evolução muito grande de 2013 para cá. Mas o maior desafio foi a falta de endorsement, ou seja, ser reconhecido pelo mercado como uma empresa segura e confiável para trabalhar.

NEGÓCIOS E o que mudou isso?

RUIZ Quando assinamos com o Alibaba. Foi um marco. Uma empresa chinesa, agressiva e querendo ganhar mercado. Foi um processo de nove meses. Demorou bastante. Mas foi algo muito significativo.

NEGÓCIOS E os outros momentos decisivos da empresa?

RUIZ É engraçado. Quando você está vivendo o momento, você acha que aquele é o mais importante. Mas, quando passa, todos são grandes momentos. Mas além do Alibaba, posso citar mais dois. Um foi a decisão de expansão. Não foi fácil. Começamos a expansão em 2015. Primeiro para oito países, sem contar o Brasil. Passamos de 2016 a 2018 melhorando as conexões que tínhamos. Em 2019, ampliamos nossa atuação. Éramos focados em pagamentos internacionais [cross border payments]. Decidimos investir em duas áreas correlatas. Criamos a nossa parte de “end user” e outra ideia que tínhamos há algum tempo: uma vez que estamos em todos os países com processamento de pagamento, decidimos investir em pagamentos locais, apoiando vendedores e compradores domésticos. E estamos levando essas iniciativas para outros países. E, no ano passado, decidimos que deveríamos “fechar” a região. Começamos uma segunda onda de expansão para mais seis países. Hoje atuamos em 15 países.

NEGÓCIOS E quando vocês receberam o primeiro investimento?

RUIZ Foi algo muito marcante.

NEGÓCIOS Por quê?

RUIZ Sempre brincávamos sobre até que ponto conseguiríamos crescer sem um “irmão mais velho”. Não estou falando

NUM ENTRAMOS MERCADO CONSOLIDADO OFERECENDO UM MODELO NOVO. NÃO FOI FÁCIL

de dinheiro, mas de um investidor para ajudar a quebrar paradigmas e dar mais força para ultrapassarmos o nosso limite. Por isso, foi muito bom quando, em 2017, fizemos o primeiro round [no qual o Ebanx captou US$ 30 milhões]. O FTV Capital virou o quarto sócio, nos ajudou muito.

NEGÓCIOS Como foi se tornar um unicórnio?

RUIZ Outro momento decisivo. De novo, zero pela questão financeira, mas pela satisfação em atingir um marco tão importante. Não lembro quantos funcionários tínhamos na época, mas mexeu com todo mundo na companhia. Foi um orgulho muito grande.

NEGÓCIOS Poderia descrever esse sentimento?

RUIZ É a sensação de correr uma maratona. Tem a adrenalina e satisfação, quando você consegue. Não é só o valuation, é uma satisfação com tudo, com o esforço de um time muito grande. Eu me lembro da festa e da satisfação dos ebankers. Mas passa rápido. Comemoramos e, como sempre fazemos, no dia seguinte é pensar na próxima conquista.

NEGÓCIOS A próxima conquista é o

IPO?

RUIZ Posso falar do que fizemos até agora. Definimos expansão para 15 países, publicamos recentemente a aquisição de operação local importante no Brasil, a fintech Juno.

NEGÓCIOS IPO está descartado?

RUIZ É algo que toda empresa em crescimento vislumbra. Temos visto muitos eventos de sucesso no mercado, especialmente na América Latina. Estamos de olho. Mas não estamos falando sobre esse assunto.

NEGÓCIOS Vocês cresceram a partir de Curitiba, uma cidade que ainda não é reconhecida pelo ecossistema de inovação. Como está sendo?

RUIZ O ecossistema está crescendo e melhorando. A aquisição da Juno é bastante significativa nesse aspecto. Ela também é daqui. Curitiba já virou um polo de startups. Há outras startups e fintechs aqui, como a Honey Island. Mas acredito que o país está evoluindo. Tudo está crescendo. Teremos mais unicórnios. E quem eu vi virando unicórnio no passado daqui a pouco vai virar “pentacórnio” e “decacórnio”.

NEGÓCIOS O que ajudou a empresa a dar os primeiros passos?

RUIZ Fomos a menor empresa apoiada pela Endeavor até hoje. Naquela época, a Endeavor ia atrás das empresas. Mas vimos no jornal uma reportagem sobre eles e resolvemos procurá-los. Era 2012, meios de pagamento começando a ser estruturados e três garotos tentando trabalhar com empresas grandes de outros países, tendo de lidar com o problema da falta de endorsement. E vimos que a Endeavor poderia ajudar nisso. Nos candidatamos. E são dois processos, o local e o internacional. Fomos para o internacional. E ali tem sessões para apresentar a empresa, eles votam, selecionam ou não. Tivemos a oportunidade de apresentar ao chairman global da Endeavor. Estávamos num estágio muito inicial. Ele perguntando sobre números e o nosso futuro. Tentamos falar ‘queremos a sua opinião’. E aí ele disse que éramos seguidores. Foi horrível na hora. Mas acabou sendo motivador. Nos ajudou a mudar várias posturas que tínhamos e passamos a mostrar mais o que a gente era. Foi uma dor, mas que impulsionou nossas vidas. Por isso continuo falando sobre isso nove anos depois.

TEREMOS MAIS UNICÓRNIOS. E DAQUI A POUCO “PENTACÓRNIOS” E “DECACÓRNIOS”

SUMÁRIO

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2021-11-30T08:00:00.0000000Z

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